Vira
e mexe o tema alimentação de crianças com SD aparece nas listas de discussão,
não só do Brasil como também da Inglaterra, dos Estados Unidos e da Alemanha.
Alimentos indicados, alimentos proibidos, suplementos e uma infinidade de orientações
surgem aqui e ali, às vezes por parte de médicos e nutricionistas, às vezes por
pais que vivenciam isso no dia-a-dia. Mas por que nossas crianças precisam de
uma alimentação diferente perguntamo-nos, e então uma serie de particularidades
referentes ao funcionamento do sistema digestivo de nossas crianças PODEM surgir
como explicação: constipação crônica, resultante do baixo tono do tecido
muscular do intestino grosso e também uma maior extensão do intestino grosso1, dificuldade enzimática na conversão do betacaroteno em
vitamina A, menor nível de
serotonina, zinco e selênio, tendências à obesidade e por aí vai.
Mas
porque eu destaquei a palavra podem? Por que cada organismo reage de maneira
diferente à existência de um cromossomo extra e em função dessas
características que nem sempre estão presentes em todas as crianças, muitas
vezes, vejo orientações muito restritas proibindo a ingestão de determinados
alimentos antes mesmo de se perceber se eles realmente são prejudiciais à saúde
dos nossos filhos. Sem querer desconsiderar o conhecimento e a experiência de
ninguém eu tenho uma visão um pouco diferente de tudo isso.
Sempre
fui muito preocupada em ter uma alimentação saudável, bastante ingestão de
frutas e legumes, pouca carne vermelha (apesar de gostar muito), farinhas e
grãos integrais, preferência a assados e grelhados a fritos e baixo consumo de comida industrializada. Durante a gravidez do Adam procurei respeitar
a risca esses princípios, uma vez que li que os hábitos alimentares das mamães
gestantes são passados aos filhos quando ainda estão na barriga. E hoje, quase dois
anos depois de que meu pequeno começou a ingerir alimentos sólidos, posso dizer
que nenhum conhecimento adquirido nessa fase foi inviável pelo fato de ele ter
nascido com síndrome de Down.
Quando
leio orientações tão restritas à alimentação de pessoas com T21 sinto que
muitos pais e profissionais tratam nossos filhos como se fossem produtos de uma
serie - a dos que tem um cromossomo a mais - e se esquecem de que outros
fatores, tais como os comportamentais, os transmitidos geneticamente pelos pais
e os de personalidade compõem os hábitos alimentares de um indivíduo.
Generalizar que todas as crianças com SD não gostam de beber agua, têm
constipação, possuem necessidade extra de vitaminas e suplementos alimentares e não
podem comer determinados alimentos com base a um modelo único, é esquecer-se do indivíduo
em detrimento da síndrome.
Mas
voltando as tantas leituras que fiz antes do nascimento do meu pequeno lembro-me
de uma que levei a risca e vejo que deu resultado. A orientação diz respeito
aos alimentos industrializados, mesmo os que são especiais para crianças. Quando
um bebê começa a inserir alimentos sólidos, por volta dos cinco, seis meses de
vida sua única experiência degustativa é o leite, cujo sabor é suave, levemente
adocicado. Se você, ao iniciar a sua alimentação, lhe fornece produtos
industrializados, que possuem aromatizantes artificiais (e consequentemente
mais fortes) dificilmente ele será uma criança que goste de frutas e legumes
naturais, cujo sabor é bastante sem graça se comparado com o que ele está
acostumado a ingerir nos copos de iogurte e nas bolachas recheadas, por
exemplo. Além, claro da serie de aditivos que esses alimentos possuem que não fazem
bem a nenhum organismo, quanto mais ao de uma criança.
Outro
aspecto diz respeito à agua, muitos pais começam a dar chá adoçado com açúcar,
mel ou leite de coco quando a criança é ainda bebê, e depois não entendem
porque quando ela fica um pouco maior não gosta de beber agua. – Não te
preocupe mamãe, já li em fóruns, crianças com SD não gostam de beber agua, é
normal, o médico falou! E por aí vai a
tal generalização, com essa ideia de que pelo fato de possuir um cromossomo a
mais eles são seres totalmente isolados dos costumes familiares, começam a dar
agua de coco industrializada, sucos artificias e refrigerantes e depois associam
os problemas digestivos e a possível obesidade a sua condição genética.
Mas
e como encontrar o equilíbrio em uma alimentação saudável sem pecar pelo
excesso ou pela restrição? A resposta esta na palavra OBSERVAÇÃO. Não foi assim
que os grandes filósofos chegaram a tantas respostas? Observando a natureza?
Pois vamos observar a natureza de nosso bebê, tomando nota de tudo o que ele
come e como seu organismo reage e com isso ter critérios para elaborar sua
dieta com base a sua realidade, não na realidade de um grupo. Essa orientação nos
foi repassada pela primeira nutricionista do Adam e hoje posso dizer que foi um
dos melhores conselhos que recebi desde que ele nasceu. Observá-lo. O
resultado, podemos ver no dia-a-dia, Adam come absolutamente todos os tipos de
alimentos e prefere agua a sucos, seu intestino sempre funcionou direitinho, os
exames de sangue até agora não têm apresentado nenhuma carência de minerais ou vitamínicas,
seu sistema imunológico é bastante bom, ele raramente pega um resfriado, mesmo
com o último inverno rigoroso da Alemanha e seu peso e estatura estão dentro do
padrão para a idade, 88 cm e 13 quilos. Se ele manterá seu gosto eclético no
futuro ou virá a desenvolver alguns problemas digestivos, não sabemos, mas quem
sabe? Pelo menos demos a ele a oportunidade de conhecer uma infinidade de
sabores e conhecer como funciona o seu próprio organismo, além de respeitá-lo como indivíduo e como ser único que ele é e sempre será.
Passos da observação -
Quando
nossos bebês iniciam a fase dos sólidos somos orientados a dar um alimento de
cada vez, por três dias seguidos e observar uma possível reação alérgica. Esse
foi o momento que ampliei meus critérios de observação anotando como seu
organismo reagia a aquele alimento, se prendia ou soltava o intestino, se o
deixava agitado ou tranquilo, se lhe causava alguma reação na pele, etc. Após os
dois primeiros meses começamos a misturar dois ou três tipos de alimentos e
nesse momento a observação passa a ser mais criteriosa, pois às vezes um
alimento não causa nenhuma reação quando ingerido sozinho, mas sim quando acompanhado de outro. Além
disso, é importante fazer uma leitura do contexto, pois uma agitação, uma
constipação ou erupções na pele podem advir de outros fatores que não
necessariamente da comida, como a toma de algum medicamento, um resfriado ou
mesmo o nascimento dos dentes. Por isso é importante anotar durante bastante
tempo e observar qualquer mudança na rotina da criança. Ao final de seis meses
pude ter um panorama bastante claro de que alimentos devem ter a ingesta restrita
a apenas uma vez por semana, que alimentos devem ser combinados com a intenção de
neutralizar os efeitos laxativos ou constipativos, quais lhe causam agitação ou
apatia. Além disso, realizamos controle sanguíneo de seis em seis meses e com
isso estamos preparados para possíveis mudanças nos seus hábitos alimentares.